terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Se você pensa em comprar a felicidade...

... primeiro é melhor torcer para que ela nasça.


Nesse último Natal, acabei reassistindo "A Felicidade não se Compra" (It's a Wonderful Life). Filme clássico para o final do ano. A história você conhece (mesmo que nunca tenha visto a obra - a idéia foi copiada, parodiada, reproduzida e adaptada por praticamente todo mundo e é bem provável que você conheça pelo menos uma dessas versões): George Bailey (James Stewart) é um homem bondoso e sempre disposto a ajudar os outros. No entanto, vários problemas surgem na vida dele o que o faz desejar nunca ter nascido. Um anjo aparece e mostra pra Bailey como seria o mundo sem ele: uma merda. Todas as pessoas que ele ama seriam infelizes, o vilão seria ainda mais poderoso porque ninguém teria culhões para enfrentá-lo, etc. Então ele reconhece que tem uma vida maravilhosa, volta a existir e curte seu final feliz ao lado da família e dos amigos.

É um filme legal, tem uma mensagem bacana e ótimas atuações. Mas, quando deixamos o emocional de lado e analisamos a trama um pouco mais friamente, deduzimos que as coisas não são bem assim. Quero dizer, pessoas deixam de nascer a todo momento e me parece meio irracional acreditar que qualquer uma delas poderia ter um impacto cataclismático na vida de tanta gente.

Essa é a imagem que o filme passa do protagonista. Na ânsia de tentar mostrar que a vida dele tem sentido, acabamos tendo a impressão de que é a vida das pessoas ao redor dele que não possuem sentido algum. Não consigo deixar de imaginar se qualquer um dos personagens secundários tivesse essa crise de baixa auto-estima. O anjo apareceria e mostraria para o infeliz que, mesmo sem ele existir, o mundo continuaria uma grande maravilha porque, felizmente, George Bailey existe.

Sabe, quando eu paro para pensar nisso, chego à conclusão de que a vida do pessoal daquela cidade deve ser uma merda. Não só eles não fazem grande diferença para a ordem natural do mundo como toda a felicidade deles depende única e exclusivamente de um homem. É uma loteria. Se os pais dele não estivessem lá muito dispostos naquela noite a vida de todos eles estaria fadada ao fracasso. Sorte deles ter ocorrido a concepção premiada!

A verdade é que, ao contrário do que diz o filme, ninguém é 100% insubstituível. Se eu ou você não existíssemos, a vida seria um pouco diferente para meia dúzia de pessoas que nos conhecem e vão com a nossa cara. Não necessariamente pior. Acho meio forçado no filme, por exemplo, que a esposa do George seja uma bibliotecária solteirona no universo alternativo - ou algo do tipo. É bem pouco provável que ela não acabaria se interessando por algum outro cara. Pode ser, realmente, que ela não seria tão feliz quanto era com o protagonista, mas essa coisa de "só tenho olhos para você, mesmo quando você não existe" nunca me convenceu. Portanto, não se iluda pensando que sua/seu namorada/mulher/namorado/marido seria um(a) pobre infeliz na sua ausência.

Ah, sim! Talvez lendo esse texto você tenha pensado em alguma personalidade histórica que, de fato, influenciou muitas vidas. E se essa pessoa não tivesse nascido muita coisa seria diferente. Bom, acho que aí já é tema para historiadores e não palpiteiros desocupados como eu. Não vou defender a tese de que, sei lá, se Hitler ou Stalin não tivessem nascido outras pessoas ocupariam seus lugares e a história fluiria mais ou menos da mesma forma. Talvez não. Talvez realmente a influência que algumas pessoas causam seja única e a não existência dela ocasionaria mudanças significativas no cenário mundial - ou mesmo local. Pode ser esse o caso de George Bailey. Mas isso não ajuda muito se pensarmos que a mensagem que muita gente interpreta ao ver o filme é: "Se eu não existisse, a vida das pessoas ao meu redor seria pior (ou melhor, no caso de Hitler e Stalin talvez)". Seguindo a lógica de que Bailey é uma dessas pessoas importantes que muda o curso da história, então a mensagem bonita e revigorante do "qualquer um tem seu valor no mundo" cai por terra. Não é qualquer um, mas apenas uns poucos que teriam essa capacidade de mudar as coisas.

Lamento analisar o filme de maneira tão drástica e praticamente destruir a magia dele. Mas eu acho que histórias existem para serem analisadas. Sempre achei esse papo de "é só um filme" limitador demais. Qual o problema de vermos mais a fundo alguns pontos na obra que talvez nem o autor tenha pensado? E daí se o que acabar sendo dito for uma grande besteira sem sentido? É melhor do que simplesmente assistir ao produto babando em frente ao sofá. Nem sei se alguém está lendo isso, mas se estiver vai uma dica: procure sim "pêlo em ovo" ou "chifre em cabeça de cavalo". Discorra sobre teorias absurdas que você elaborar sobre qualquer enredo. Você terá o meu respeito se fizer isso - não que isso signifique muito, mas...

Bom, mesmo que você tenha meu respeito, isso não muda o fato de ninguém sentiria sua falta se você não existisse. Lamento. Hum... acho que eu deveria escrever auto-ajuda, hein?

...

PS: Texto mais ou menos filler. Só para diversificar um pouco o assunto porque o próximo provavelmente será sobre Donkey Kong Country Returns e deverá ser um dos maiores que escreverei nesse blog. Talvez eu tenha que dividi-lo em duas ou três partes. Coisas que mexem com nostalgia rendem...

PSS: Incluir "É só um filme" na lista das Frases que odeio.