sábado, 16 de junho de 2012

Buraco Negro - parte 4

- Por que você se inscreveu nisso? - perguntava Jonatas confuso - Você é péssimo em matemática!

Nicolas limitou-se a dizer que era algo que ele precisava tentar. E ele respondeu a essa mesma pergunta mais duas vezes naquele dia: primeiro para sua mãe e depois para seu irmão. Se ele dependesse do entusiasmo alheio para ser bem sucedido nesta prova, estaria perdido.


Mas ele não estava disposto a deixar essa chance passar. Estudou como nunca havia estudado antes. Exigiu de seu cérebro bem mais do que costumava fazer. Ninguém acreditava realmente que fosse conseguir. Nem mesmo ele. Por isso, quando o resultado final foi divulgado, a surpresa foi geral.

- Quarto colocado? - repetiu a mãe atônita, sem acreditar no que via.

- Na semana passada mesmo você reclamou que não conseguia resolver problemas simples de regra de três! - completou o irmão.

Nicolas não deu importância. Ele estava entre os cinco melhores e iria para a capital disputar a fase seguinte. Ou melhor, iria para a capital investigar o que houve com a professora. O próximo passo era esse: encontrar um meio de chegar à casa do velho.

Procurou o endereço na internet e viu que não era muito longe da escola onde seria realizada a prova. Elaborou uma lista de perguntas que gostaria de fazer ao velho e dormiu. Não longe dali, dois homens conversavam. O uniforme verde e as letras "VLC" grafadas em dourado indicavam que ambos trabalhavam para a mesma companhia.

- Você acha que ainda teremos problemas? - perguntou o primeiro.

- É melhor continuarmos atentos. - respondeu o outro - não sabemos até onde ela foi...

...

A viagem até a capital seguiu-se animada, como uma excursão qualquer. Erina ia puxando algumas cantigas e os alunos iam acompanhando. Em determinado momento, ela expunha alguma questão matemática e o estudante que resolvesse o problema primeiro ganhava um brinde. Era uma forma de mantê-los focados na matéria. Mas a tática não funcionava com Nicolas.

Ao chegarem a escola, Erina pediu para que os alunos formassem filas. Várias outras escolas tentavam fazer o mesmo. Eram cinco alunos por série, o que significava que algumas instituições traziam até sessenta representantes.

Nicolas aproveitou a cofusão para fugir. Misturou-se com um grupo de estudantes que acabava de chegar e saiu pelo portão, escondendo-se atrás dos ônibus. Atravessou a rua e seguiu para onde o mapa dizia ser a casa do velho. Enquanto se aproximava, seu coração acelerava. Pela sua mente passavam vários pensamentos que pareciam dispostos a fazê-lo desistir dessa loucura.

"E se ele não estiver em casa?" "Quem garante que esse é o enderelo dele mesmo?" "E se o bilhete não foi para você?" "Será que ele sabe mesmo alguma coisa?" "Você vai mesmo desistir da prova?"

Chegou enfim à casa indicada. Tocou a campainha, tremendo de pânico. A essa altura, ele não sabia se queria ser atendido ou não.

Independentemente de seu desejo, a porta se abriu. Aquele mesmo senhor que Nicolas havia visto chorando sobre o caixão de Teresa estava novamente a sua frente.

- Você... veio mesmo! - suspirou o homem. Em seguida, ele olhou as ruas a sua volta, como se procurasse alguém. Aparentemente não encontrou, o que parecia ser bom - Entre!

Nicolas hesitou, mas obedeceu. A casa parecia ser simples, mas bem arrumada. Dois gatos gordos dormiam em cima da estante da sala. O velho tirou alguns jornais de cima do sofá e ofereceu o assento ao seu visitante.

- Aceita alguma coisa? - perguntou o anfitrião, enchendo um copo com alguma bebida alcoolica que Nicolas não conhecia.

- Não, obrigado.

Em seguida, o homem sentou-se numa poltrona, ficando frente a frente com o garoto.

- Meu nome é Godofredo Campbell.

- Me chamo Nicolas.

- Eu sei.

- Sabe?

Godofredo não podia ignorar a expressão no rosto do menino ao ouvir tais palavras. Decidiu recomeçar.

- Minha filha mais velha, Teresa, era sua professora até poucos dias. Foi ela quem me falou de você.

- Sim, mas ela...

- Não precisa dizer - interrompeu o velho - todo mundo sabe o que houve com ela. Ou melhor, ninguém sabe o que houve com ela exatamente...

Nicolas permaneceu em silêncio. Godofredo entendeu que deveria prosseguir.

- Há uns dezesseis anos, minha filha mais nova, Kátia, foi morta pelo marido. Edmundo era o nome daquele... - Godofredo preferiu não dizer o que pretendia - ninguém sabe exatamente o motivo. Ela era jovem e ingênua... ele nem tanto.

- Soube que ele sumiu...

- Sumiu. Mas eu seu onde ele está. E Teresa também sabia!

Nicolas sentiu sua espinha vibrar.

- Então ela...

- Quando descobriu o paradeiro dele, Teresa foi atrás. Ela não sossegaria enquanto não o visse pagando pelo crime que cometeu. Mas quando chegou a sua cidade, viu que a situação era mais complicada do que parecia...

- Ele está na cidade? - perguntou Nicolas, excitado ao ver sua teoria sendo comprovada - Foi ele quem matou a professora Teresa?

Godofredo baixou a cabeça. Não sabia como continuar. E lembrar-se das duas filhas mortas também não era algo muito prazeroso.

- Eu disse que a situação é mais complicada do que parece... não foi ele quem matou Teresa... foi a agência...

- Quem é ele? - continuou Nicolas - É alguém que eu conheço?

O velho sabia que a partir de agora a conversa não ficaria nada agradável. Virou todo a bebida que ainda restava no copo e continuou.

- Não só conhece, como mora com ele.

Nicolas gelou. Era como se tivesse morrido por um instante. Sua respiração parou e ele podia jurar que seu coração não estava mais batendo.

- Meu... pai?

Godofredo acenou negativamente com a cabeça.

- Seu irmão.

Agora Nicolas parecia mais confuso do que apavorado. Chegou até a pensar que o homem estaria zombando dele.

- Mas meu irmão só tem quinze anos! - matemática podia não ser seu forte, mas estava bastante claro para ele que Otávio não havia sequer nascido quando Kátia fora assassinada.

- Bem... - continuou Godofredo - não foi o seu irmão, necessariamente...

A resposta só confundiu as coisas ainda mais. O velho deu mais um longo suspiro:

- Acho que, para entender essa história, você precisa saber da existência de um lugar... uma agência chamada Vida a la Carte...

***
Finalmente essa história andou! Três exigências já aplicadas. Agora começa a parte chata...