Passei dias pensando na melhor maneira de te dizer isso. Precisei de umas boas garrafas de cerveja para tomar coragem. E ainda assim, sei que vou me arrepender pela manhã.
É evidente que algo mudou entre nós. Não tente fingir que não havia percebido. Você não é burra. Talvez você não saiba específicar quando essa mudança ocorreu. Mas eu sei. Me lembro perfeitamente da tarde, a pior tarde da minha vida, quando soube da notícia.
Foi há oito meses. Nenhum de nossos amigos falava em outra coisa. Você tinha começado a namorar aquele cara. O chão sumia debaixo dos meus pés. Meus órgãos vitais secavam por dentro. A vista começou a embaçar e tudo que o cérebro processava era: você... namorando... outro.
Na hora, não entendi porque aquilo me incomodava tanto. Afinal, éramos apenas amigos. Grandes amigos. Amigos de infância. Nada mais, nada menos. Talvez fosse apenas um susto, um choque. Com o tempo eu me acostumaria com a ideia e tudo voltaria a ser como antes. Pelo menos, era o que eu pensava.
Mas quanto mais passava o tempo, mais a ferida aberta doía. Ao ver vocês juntos pela primeira vez, naquele sábado chuvoso em que você nos apresentou, senti que não suportaria. Esperava pacientemente por um raio que pudesse cair na minha cabeça. Ou na dele. A cada beijo que ele lhe dava, refletia em mim como um chute no estômago.
Naquela noite, chorei. Chorei como nunca havia chorado antes. Foi quando decidi me afastar e a te tratar com frieza e indiferença. Talvez assim, um dia, as coisas poderiam voltar a ser como eram.
Conheci várias mulheres nesse meio tempo. Mas nenhuma foi capaz de me fazer te esquecer. Logo eu, que sempre zombava dos patéticos apaixonados das comédias românticas que você tanto gosta.
Seis meses e doze dias. Foi o tempo que durou a aventura de vocês e o meu martírio. Sim, eu contei. Quando soube do rompimento, uma chama se acendeu dentro de mim. Eu voltei a viver e estava decidido a não deixar nada disso ocorrer de novo.
Voltamos a estabelecer contato. Aos poucos, fui tomando coragem para te convidar para programas a dois. Um cinema, um barzinho, um passeio no parque. Você parecia bem, mas não queria forçar nada. "Dê um tempo a ela.", dizia a mim mesmo.
Pois bem. O tempo acabou. Eu sabia que, se demorasse muito, outro poderia passar a minha frente. E isso, eu não conseguiria suportar.
Como jamais teria coragem de te dizer tudo isso pessoalmente (você certamente riria e não acreditaria em mim. Não se preocupe. Eu sei do papel ridículo que estou fazendo. Eu mesmo riria de mim se fosse qualquer outro em meu lugar), optei por escrever essa carta.
Não interprete esse texto como uma intimação. Você não tem obrigação nenhuma comigo se não estiver interessada. E caso aceite esse "convite" não quero que o faça por pena ou por sentir culpa de alguma coisa. Também não tenho pressa alguma. Se você acha que precisa de mais um tempo sozinha, eu vou entender.
Sinceramente, não sei se essa carta vai me ajudar a ter alguma chance com você. Talvez ela até coloque em risco nossa amizade. Mas achei que deveria escrevê-la mesmo assim. Sei que ela está confusa e cheia de clichês. A isso eu culpo o álcool, a minha falta de romantismo e a orgia de sentimentos antagônicos que experimentei nesses últimos oito meses.
Tudo o que você precisa saber é: Eu te amo.
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Nota do autor: Romantismo é uma das coisas que mais tenho dificuldades em escrever. Sempre acho que fica algo forçado demais. Como junho já está chegando ao fim e o mês corria o risco de ficar sem post, decidi arriscar um texto de improviso pra ver o que saia. A falta de talento eu disfarço culpando o narrador. Que por sua vez culpa "o álcool, a minha falta de romantismo e a orgia de sentimentos antagônicos que experimentei nesses últimos oito meses."