sábado, 17 de agosto de 2013

Lar, doce lar

Bete só queria chegar em casa e relaxar. Depois de um dia cheio no trabalho, depois de uma hora e meia de exercícios na academia, depois de enfrentar um supermercado lotado só para comprar ração para gatos, seu corpo pedia por um bom banho quente e uma cama confortável.

Tirou mecanicamente o molho de chaves do bolso e abriu a porta. Reclamou consigo mesma ao ver que as luzes da sala estavam acesas "a conta esse mês vai vir um absurdo!". Mas ao observar melhor, viu que as lâmpadas acesas não eram a única coisa estranha por ali.


Havia um homem sentado em seu sofá, zapeando os canais da TV. Mais ao fundo, uma mulher sentava-se à mesa da cozinha com um jornal em uma mão e uma xícara de café na outra. Os dois pararam o que estavam fazendo para lançar olhares de interesse e estranhamento para a intrusa.

- Quem são vocês? - perguntou Bete, recuperando-se do susto.

- Os donos desta casa - respondeu o homem com rispidez - e você? Quem é?

Bete soltou um riso nervoso - é alguma brincadeira?

- O que você faz aqui? - perguntou a mulher parecendo mais amigável que o homem, embora mantivesse o mesmo tom inquisidor - como conseguiu entrar na nossa casa?

Por um instante, Bete se perguntou se não havia entrado na casa errada. Mas a hesitação durou pouco. A decoração era a mesma. O estilo e a disposição dos móveis, a cor das paredes, os vasos de flores, tudo estava do jeito que ela havia deixado de manhã, quando saiu para trabalhar.

- Essa casa é minha - disse por fim.

O casal trocou um olhar de confusão.

- Do que é que você está falando? - perguntou a mulher, que olhava para Bete como se ela fosse maluca.

- Estou apenas dizendo que essa casa é minha. Eu não sei quem são vocês e nem como conseguiram entrar aqui, mas eu peço por gentileza que...

- Olha, moça - interrompeu o homem - eu não sei o que você andou fumando, mas o bagulho deve ser bom. Eu e a minha esposa moramos aqui há dois anos. Acho que se você estivesse vivendo sob esse teto, a gente teria percebido antes, não é?

- Isso é um absurdo! - Bete começava a perder a paciência - Faz cinco anos que moro aqui! Cinco! Acha mesmo que eu não reconheceria minha casa?

- Liga para o hospício - disse o homem à esposa - pergunta se alguma paciente fugiu de lá hoje...

Bete passou as mãos pelos cabelos em sinal de desespero. Subitamente, a solução para aquele impasse pareceu brotar em sua mente.

- As fotos! Tem uma caixa de fotos minhas em cima do guarda-roupas! Eu posso pegá-las e mostrar a vocês...

- Nós não vamos deixar você entrar no nosso quarto! - bradou a mulher, que começava a ficar irritada - além do mais, em cima do guarda-roupas estão as nossas fotos!

- Isso só pode ser brincadeira! Os vizinhos, então! Vamos perguntar aos vizinhos quem é que mora aqui!

- Nós não vamos fazer parte dos seus devaneios! - gritou o homem.

- Se você não sair daqui agora mesmo, nós vamos chamar a polícia! - anunciou a mulher

- Chama! Chama a polícia! - Bete começava a ficar fora de si - quero ver vocês dois presos por invasão de domicílio!

...

Alfredo terminava de fazer a sua ronda quando recebeu o chamado.

- Temos uma chamada inusitada - disse a voz do outro lado do comunicador - um casal diz que sua casa foi invadida por uma mulher... e a mulher jura que a casa é dela e que os invasores são os dois.

- Vou dar uma olhada - disse Alfredo - qual o endereço?

- ...

- Como? Você tem certeza que o endereço é esse?

- Sim. Por quê?

- Esse é o endereço da minha casa.